Aspas: Todo Meu Amor (All my loving)


Sabe como eu sei que aposto em nós? Esses dias fiz uma analogia entre seu jeito de sorrir e uma música dos Beatles. Isso não é pouca coisa, você que nunca fica satisfeita com minhas demonstrações afetivas. Isso é grande, garota. Eu jamais, em toda minha carreira de quinze anos de feitos amorosos, ousei associar coisas como "Something" e "I Want You (She's So Heavy)" ou "Girl" com nenhuma, justamente por respeitar o poder devastador da música.

Eu li alguns livros, entre eles "A Insustentável Leveza do Ser", você sabe, falo sempre sobre o Milan Kundera. Bem, o caso é que o livro se resume numa frase do autor, algo como "o amor começa no instante em que uma mulher se inscreve com uma palavra em nossa memória poética." - E como as mulheres fazem isso? Lição número um: sendo diferente das outras, isso você já foi capaz; dois: deixando saudade em alguma canção. Se existe cupido e esses troços, suas aparições vem em formato de refrões pegajosos.

Nenhuma outra foi digna de Beatles. Tive de isolar os rapazes de Liverpool de todos os meus relacionamentos com disciplina zen. Não queria perdê-los, não queria deixar de executá-los depois que esses romances velhacos me provocassem amargura, vômito, ressentimento e intenções suicidas. Quando aquela outra me chutou por um cara mais, digamos, lustroso, sabe o que aconteceu com "True Love Waits" do Radiohead? Nunca mais. Até hoje a voz do Thom Yorke corta a pele ao redor dos meus mamilos feito uma faca velha e sem fio.

Exagero? Então ouve isso: sabe quantas vezes repeti "True Love Waits"? Cinco? Dez? Cinquenta? (Risos) Umas quinhentas, quando parei de contar. No duro. E assim vários outros conjuntos e canções foram banidos por fazer meu ouvido chorar sangue de saudade. Lado A: 1. "Warning Sign", Coldplay; 2. "All I Want Is You", U2; 3. "Walking After You", Foo Fighters; 4. "Wish You Were Here", Pink Floyd; 5. "Broken", Tracy Chapman. Lado B (as que hoje não latejam tanto assim): 1. "Don't Go Away", Oasis; 2. "Oh, Girl", Paul Young; 3. "Look What You've Done", Jet; 4. "I'm In You", Peter Frampton; 5. "All My Love", Led Zeppelin. E "True Love Waits", onde está? Bônus track.

Você viu alguma dos caras na minha coletânea de "The Best Of Singles About My Failed Relationships"? Não. Eles sempre foram meus protegidos, os intocáveis, os blindados, sempre viveram numa espécie de bolha à prova de ondas radioativas de rejeição, as músicas que ouço quando não quero pensar em ninguém, quando não quero futucar meus dedos calejados em alguma ferida. Aí veio você e me pega desprevenido, vulnerável, apaixonado e achando realmente que encontrou uma pessoa especial na multidão.

Pronto, não consigo ouvir "If I Feel" sem reviver aquela vez naquela pracinha de pombos negros, você dizendo que se entregaria a nós, se pudesse confiar em mim. Pois estou depositando no nosso amor toda minha confiança, como pode ver. Espero que você esteja realmente satisfeita e sã da responsabilidade que é tornar-se minha sócia em todas essas faixas, as que meu pai me botava pra ouvir quando era um feto de, sei lá, seis ou sete semanas - elas me devolvem ao útero, o melhor lugar do mundo inteiro, dá pra entender? Você tem todo meu amor, os Beatles e mais um milhão de motivos pra não me magoar.

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